Entrevista com a Deputada Estadual de Minas Gerais, Andréia de Jesus (PT/MG)
Andréia foi reeleita para o segundo mandato de Dep. Estadual na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. Sua história de luta já é conhecida em todo o Brasil, ganhando espaço no cenário nacional. Para Andréia lutar pelos direitos humanos, pelas comunidades em estado de vulnerabilidade social e pelo meio ambiente, serão seu motores nesse mandato.
Mulher guerreira, mulher de fibra, com vocês Andréia de Jesus!
Você é a primeira da sua família que cursou uma
faculdade, e hoje é uma inspiração para Ribeirão das
Neves. Em que momento da sua história você decidiu
entrar para a política?
Andréia: Para um corpo negro, estar efetivamente na política é ocupar um lugar que foi antes negado. Por todos os anos, gerações e histórias vividas pelo nosso povo preto, temos que buscar cada vez mais a emancipação e isso diz muito sobre os espaços políticos e de decisão. Sou uma mulher negra, já fui empregada doméstica, sou mãe solo e que rompeu com o que estava fadado pela sociedade machista e branca de achar que o negro não pode ter outro lugar que não seja servindo. Foi um despertar ou me reconhecer na missão. Aos 35 anos, ingressei na Faculdade de Direito com uma bolsa de 100% do Programa Universidade Para Todos, o ProUni. Foi na graduação que tive o primeiro contato com as Brigadas Populares. A partir daí, fui conhecendo mais de perto a luta fundiária, dos sem teto, dos sem terras e também a luta da Associação de Amigos e Familiares Privadas de Liberdade. Passei a acompanhar cotidianamente essas lutas e tudo isso a qualificou nas pautas das relações raciais, de gênero e classe. Um pouco mais tarde, enquanto trabalhava na Secretaria de Educação de Ribeirão das Neves, fui convidada a integrar a equipe das vereadoras recém eleitas em Belo Horizonte, Cida Falabella e Áurea Carolina. As duas parlamentares se uniram e inauguraram o projeto “Gabinetona” na capital mineira. A partir daí, me formei e segui trabalhando no mandato e atuando como advogada popular até que, em 2018, me candidatei pela primeira vez a um cargo político: Deputada Estadual de Minas Gerais.
Você citou Marielle Franco em uma entrevista para Campanha de Mulher, projeto autônomo de visibilidade para candidaturas feministas da ELLA – Rede Internacional de Feminismos. Na entrevista cita que Marielle te convocou. Fazer política com esse sentimento te modifica ou te realiza?
Andréia:
A morte de Marielle, em 2018, aconteceu no mesmo período em que a minha vida já estava se modificando para novos desafios políticos. Sofremos o baque e, logo em seguida, decidi parar e refletir sobre a luta anti-racista e todas as outras que Marielle representa. Posso dizer que o assassinato de Marielle Franco virou uma das bandeiras que carrego e vejo que ela fez brotar outras gerações de mulheres negras que querem continuar ocupando cargos políticos, pois, são nesses lugares que nosso povo também deve estar.
Cornel West em seu livro “Questão de Raça”, amplia o debate racial nos Estados Unidos. Aqui no Brasil como se pode aprofundar esse debate?
Andréia:
No Brasil temos muito claro que a discussão para o racismo é na forma estrutural. Por isso, menciono o nosso Ministro dos Direitos Humanos, Sílvio de Almeida. Ele fala que “o racismo é a manifestação normal de uma sociedade, e não um fenômeno patológico ou que expressa algum tipo de anormalidade”. Ou seja, o racismo é um elemento que têm na sua própria estrutura a discriminação, privilegiando algumas raças em relação às outras. No nosso país, o negro é visto como um povo que ocupa o lugar abaixo da sociedade em diversas questões e não podemos aceitar que seja desta forma. Nós estamos e vamos avançar. Precisamos discutir o lugar e ocupar outros, porque queremos o nosso povo indo a frente. Nós podemos e vamos avançar criando oportunidades pois o meu compromisso é com o povo preto e com o lugar onde piso.
Você retorna para a Câmara de Deputados de Minas
Gerais, depois de um mandato que teve uma ameaça de
morte. Zema, é um governador com o posicionamento
bolsonarista, e este posicionamento do governador
preocupa a democracia em Minas Gerais?
Andréia:
Sim, a continuação do Governo Zema é totalmente vista como um risco à democracia. É a herança maldita deixada por Bolsonaro. No outro mandato tivemos muitos desafios ligados ao Governo Estadual e continuaremos sendo resistência para garantir a fiscalização e a efetivação do controle social para minimizar os efeitos, principalmente os antidemocráticos. Tivemos grandes perdas, principalmente para os direitos humanos, das comunidades em vulnerabilidade social e para o meio ambiente. Em contrapartida, nós vamos trabalhar. Vamos cobrar e acompanhar de perto. Minas não merece um governador com atitudes antidemocráticas e que se recusa a olhar para as reais necessidades do povo, como está proposto pelo Governo Federal. Exemplo disso, Zema não se comprometeu a pagar o piso nacional dos professores, proposta do Ministério da Educação. Além da atitude ser irreverente, é, no mínimo, irresponsável.
O governador Romeu Zema foi bem avaliado em seu
governo pelos mineiros, e recolocado no cargo. Como
você visualiza o novo mandato de Zema, e como será sua
relação partidária com o governador?
Andréia:
Zema foi reeleito em Minas porque o nosso estado ainda opera muito no que é tradicional e colonialista. Ele é colonialista e, para muitas pessoas, ainda vivemos no que é desconhecido e não valorizado. Meu compromisso é com o desenvolvimento do nosso povo e, por isso, minha briga é para mostrar uma Minas Gerais de pessoas que não conhecem e não valorizam os quilombos, as comunidades e os espaços que o restante da sociedade ainda não está enxergando. Não tenho grandes expectativas, mas quero continuar a ampliar as políticas públicas, de educação, saúde e também lutar contra o sistema prisional que é uma quebra urgente e constante dos direitos humanos.
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